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Moto soltando fumaça nas primeiras partidas, pode ser defeito no retentor da válvula

Usar o “achismo” baseado na suposição poderá induzir o reparador ao erro e colocar a credibilidade da oficina em dúvida, isso não é bom, por isso é importante conhecer muito para diagnosticar bem

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Por Paulo José de Sousa


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Todo reparador sabe que fumaça saindo pelo escapamento é sintoma de defeito no motor, há um certo conceito entre os mecânicos de motocicletas que diz “quando a fumaça aparece pela manhã ou nas primeiras partidas é consequência de desgastes nos retentores das válvulas, será? 

Popularmente esse sintoma é bem conhecido, mas os diagnósticos das possíveis causas dos defeitos podem levar a inúmeros resultados nem sempre esperados. Nosso objetivo não é contrariar a opinião dos reparadores, até porque há lógica nessa linha de raciocínio, no geral esse ponto de vista está correto. 

A nossa intenção é chamar a atenção para a elaboração de uma análise mais profunda. Há sempre a possibilidade de existirem defeitos ocultos, caso haja, eles irão aparecer, por isso é necessário investir tempo nos diagnósticos. (Fig.1)

Fig. 1 - Retentor de válvula

O histórico é sempre o mesmo: Inicialmente o motor funciona “redondo”, pega nas primeiras partidas, o único sinal que algo não vai bem é a fumaça saindo pelo escapamento, e assim a fumaça desaparece logo após o aquecimento do motor. 

Alguns reparadores defendem a ideia de que quando há fumaça saindo pelo escapamento nas primeiras partidas é indicação de defeito nos retentores de válvulas. Essa suposição é baseada na lógica que uma pequena porção do lubrificante desce pela haste da válvula enquanto o motor está desligado. Quando o motor é ligado e aquece, o lubrificante que está aderido na(s) válvula(s) é transformado em fumaça. Em outras palavras, o óleo “frita” quando entra em contato com a alta temperatura da câmara de combustão ou com o coletor de escapamento, e assim a fumaça desaparece logo após a queima dessa porção de óleo.  Apesar de ser uma possibilidade, é bom desconfiar, pode existir outra causa para a presença do lubrificante no local indevido. 

Na maioria das situações o motivo da infiltração do óleo está no retentor de válvula que já não veda mais, mas o serviço não termina aí, é necessário fazer um levantamento da causa do desgaste do retentor. Trocar a peça achando que o serviço está concluído pode ser um “tiro no pé”, ou mero amadorismo. Em casos mais complexos há motores que emitem ruídos de batida de válvulas.  Nessa condição o sintoma pode decorrer de folgas entre a guia e a haste da válvula. (Fig.2)

  

Fig. 2 – Cabeçote em corte – retentor de válvula (1), guia (2) e válvula (3)

Folga do conjunto guia e haste da válvula

Quando há folga excessiva no conjunto ocorre uma oscilação lateral na haste da válvula. Além de causar danos no retentor, essa movimentação emitirá ruído semelhante ao de batida de válvula, portanto a troca do retentor será uma solução de baixa eficiência e pouca durabilidade.  

Para essa situação a ação corretiva corresponderá à troca da guia, retentor e válvula (se a condição da válvula estiver fora de especificação) (Fig.3)

 

Aspecto dos desgastes na guia de válvula

Fig. 3 - Conjunto válvula e guia com desgastes

O retentor  assegura a vedação entre a válvula e a guia, com o retentor deformado a vedação será limitada e assim inicia-se o processo de queima de óleo do motor. Desgastes no conjunto não ocorrem da noite para o dia, só acontecem após milhares de quilômetros rodados. 

As válvulas trabalham em grande velocidade, sob alta temperatura, para que ocorra o perfeito controle do sistema de admissão e escape é necessária uma pequena folga de dilatação e espaço para uma fina película de lubrificante.

 A troca do retentor de válvula requer a remoção do cabeçote, conhecimento técnico e ferramental específico.

Guia de válvula solta no cabeçote como causa de ruído e queima de óleo de motor

Um elemento causador de ruído na parte superior do motor pode ser a folga entre o cabeçote e a guia de válvula, não é um defeito comum, mas ocorre.  Falhas nos processos de instalação da guia podem facilitar o aparecimento de folgas, normalmente a guia é encaixada por interferência, ou seja, a folga de ajuste é mínima, por isso na instalação é necessário aplicar muita pressão para facilitar o encaixe. Para outras técnicas de instalação a recomendação é aquecer o cabeçote e congelar da guia , assim a dilatação do cabeçote e a retração da guia possibilitam a correta montagem sem muito esforço. 

No processo de montagem da guia de válvula no cabeçote é necessário observar a regra definida pelo fabricante da motocicleta. (Fig.4)

Fig.4 - Cabeçote, válvula, retentor e guia

Além do ruído, a guia solta (folga entre a guia e o cabeçote) também possibilitará a infiltração do óleo na câmara de combustão que resulta em uma queima de óleo permanente. Durante a montagem da guia é necessário substituir o anel de vedação que fica logo abaixo da peça. (Fig.5) (Fig.6)

Fig. 5 - Guia de válvulas vista pela câmara de combustão

Fig.6- Guia de válvula e cabeçote

Caso haja  folga entre a guia e o cabeçote e necessário substituir guia de válvula e cabeçote. (Fig.7)

Fig. 7 – Verificação da espessura da haste da válvula

Outras causas de ruídos na parte superior do motor que fazem o reparador pensar que são válvulas batendo  

Regular válvula para eliminar ruído nem sempre será a melhor opção. No motor o sintoma detectado pode ser a batida de válvula, mas as causas podem ser um defeito na válvula ou em outra peça do conjunto. Veja abaixo algumas possibilidades:

Prováveis peças com defeitos: 

• Válvula com a cabeça ou borda danificada; 

• Válvula empenada; 

• Sede da válvula solta;

• Mola de válvula quebrada ou com a pressão abaixo da especificação;

• Comando de válvulas com ressaltos gastos; 

• Folga nos mancais do(s) comando(s); 

• Parafuso de ajuste de válvula solto ou danificado;

• Suporte de balancins com folgas;

• Balancins danificados;

• Folga entre o eixo e balancim.

A queima de óleo de motor e as consequências ao motor e sistema de ignição

Se a infiltração de óleo for pela válvula de admissão o carvão proveniente da queima do óleo contaminará a vela de ignição e futuramente ocorrerão dificuldades na partida e falhas no funcionamento do motor. O acúmulo de carvão no topo do pistão e na câmara de combustão pode ocasionar detonação (queima irregular da mistura). A detonação provocará ruídos anormais e pré-ignição, e por fim a quebra do motor.

A outra hipótese trata de infiltração de lubrificante pela válvula de escapamento, nessa condição a queima do óleo será no coletor de escape, logo na saída do cilindro. A depressão criada pela saída de gases do motor fará o lubrificante ser “sugado” diretamente para o sistema de escape, nesse caso não há contaminação da vela de ignição pistão e câmara de combustão. Nesse caso todo tipo de concentração de carvão decorrente da queima do óleo será nos componentes do escapamento, exemplo: sonda lambda e catalisador.

A queima de óleo e as consequências ao sistema de injeção eletrônica e catalisador

Nas motocicletas equipadas com injeção eletrônica poderá ocorrer contaminação do sensor de oxigênio (sonda lambda). O correto funcionamento do sistema de injeção dependerá da identificação do percentual de O2 no escapamento. No sistema Flex, o sensor de oxigênio é peça fundamental para o reconhecimento do tipo de combustível (gasolina, álcool ou a mistura de ambos). Concentração de carvão no sensor altera ou impede o seu funcionamento. 

A queima de óleo será prejudicial ao catalisador, com o passar do tempo ocorrerá concentração de carvão e obstruções nas passagens do catalisador (colmeias). Sendo assim, não haverá conversão de gases e as emissões de poluentes serão acrescidas. Outro agravante é a queda no desempenho da motocicleta e aumento no consumo de combustível.  

Outras fumaças que não são consequência da queima de óleo do motor

Fumaça no escapamento nem sempre corresponderá a queima de óleo do motor. São elas:

• Vapor de água proveniente do sistema de catalisador como resultado da transformação dos gases.

• Fumaça proveniente de queima do líquido do radiador, proveniente de falhas de vedação do sistema de arrefecimento

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