Este ano comemora-se o 55º aniversário de lançamento do Audi 100, um dos modelos mais importantes da história da empresa, e que muitas vezes é esquecido neste lado do Atlântico em favor dos primeiros carros a aportarem por aqui, tais como a perua esportiva RS2, um derivado direto do modelo 80. Mas a linha 100, que estreou em 1968, foi mais do que apenas a tentativa da marca de Ingolstadt de lançar um sedã executivo na esperança de desviar a participação de mercado da Mercedes-Benz. Marcava também o início de uma nova era para a marca Audi, que durante os anos de 1920 a 1930 havia ganho reputação no segmento de veículos de luxo dotados de motores de seis e oito cilindros em linha.
Um novo começo – os “Quatro Anéis” na Baviera
No final de 1945, os principais funcionários da Auto Union na antiga cidade militar de Ingolstadt abriram um depósito para peças de reposição para os veículos da marca. Em 3 de setembro de 1949, esse feito levou à formação da Auto Union GmbH, uma empresa de manufatura independente que foi liberada de seus antigos vínculos com a corporação homônima localizado no estado da Saxônia. Ainda nesse mesmo ano, iniciou-se a fabricação de furgões de entrega e motocicletas - DKW F 89 L e a DKW RT 125 W, ambos dotados de motores de dois tempos. Durante os anos de 1950 estratégia dos executivos da Auto Union era de encontrar um forte parceiro para a marca no médio prazo. Em abril de 1958, a Daimler-Benz AG (controladora da Mercedes-Benz à época) adquiriu 88% das ações da Auto Union e, no ano seguinte, a empresa de Ingolstadt tornou-se uma subsidiária integral.
Renascimento da marca Audi
A dependência do motor de dois tempos, a falta de política de novos modelos e a cobertura da imprensa cada vez mais crítica significavam que as vendas de veículos DKW estavam em uma espiral descendente no início dos anos 1960. Diante desse cenário, a Daimler-Benz encomendou ao engenheiro Ludwig Kraus, contratado como Diretor Técnico em Ingolstadt, os estudos para a adaptação de um novo motor de quatro cilindros e quatro tempos, trazido como uma espécie de “dote” para o novo DKW F 102, lançado em 1962.
O lançamento do F102 coincidiu com mudanças significativas na Auto-Union. Em 1964, a Daimler-Benz vendeu a metade de sua cota acionária para a Volkswagen. A marca da estrela tinha sido em grande parte um acionista ‘sem intervenção’, raramente interferindo na Auto-Union. Já a Volkswagen tinha em pauta utilizar a capacidade de produção de Ingolstadt para produzir o VW Sedã (Fusca).
A Volkswagen manteve cronograma de aperfeiçoamento do DKW F102 iniciado pela Daimler-Benz de substituir o motor de dois tempos por um trem de força de quatro cilindros de quatro tempos de 1,7 litro. Mudanças sutis também foram feitas no estilo, com a introdução de uma nova dianteira para abrigar propulsor de maior dimensão, além de retoques visuais com a instalação de um par de faróis retangulares. Embora o carro fosse basicamente um DKW com motor quatro tempos, a Volkswagen optou por romper totalmente com o passado. O nome DKW foi abandonado e a marca Audi, que não fabricava um carro desde 1938, ressuscitou. Em 1965 era apresentado ao público o Audi F103.
Em 1966, a Volkswagen comprou o restante da Auto Union da Daimler-Benz, mas não planejava deixar o fabricante exercer muita sua independência de projetos. Na verdade, os executivos da Volkswagen instruíram o diretor técnico da Auto Union, Dr. Ludwig Kraus, a não desenvolver novos modelos Audi baseados em DKW. O engenheiro Kraus acreditava que a Audi poderia sim, desenvolver um modelo próprio, com tecnologia bem diversa daquela empregada pela empresa-mãe, ainda focada nos motores traseiros arrefecidos a ar e suspensões com barra de torção.
Mas o Dr. Ludwig Kraus prosseguiu em segredo com o desenvolvimento de um inédito modelo da Audi. O carro resultante, que a administração do grupo em Wolfsburg aprovou para produção, foi apresentado pela primeira vez à imprensa internacional no Salão Automóvel de Frankfurt de 1968 e recebeu o nome de Audi 100. O sedã 100 foi o primeiro veículo a se livrar totalmente dos vínculos genéticos com os antigos modelos DKW.
Grande Audi
A marca das quatro argolas ingressava em um segmento superior com um sedã médio-grande de quatro portas, o código do projeto era F 104 C1, o número 100 referia-se à potência de 100 cv (74 kW), e foi o maior carro da empresa desde o renascimento da marca Audi pela Volkswagen em 1965. Vale ressaltar que a Volkswagen a princípio relutou em deixar a Auto Union empregar o símbolo dos anéis para identificar a nova Audi, posteriormente os dirigentes da fábrica de Wolfsburg autorizaram a aplicar o emblema e assim habituar seus clientes com a nova marca.
O modelo 100 adotava uma carroceria de três volumes de estilo sóbrio e equilibrado, dotado de uma grande área envidraçada, com 4,59 metros de comprimento e 2,68 m de entre-eixos. O visual estava alinhado com aquele apresentado pelo F103: faróis retangulares ladeando a grade tendo ao centro o símbolo das quatro argolas entrelaçadas, para-choque cromados com luzes de direção ao centro, capô e tampa do porta-malas à mesma altura, lanternas posteriores retangulares, formas arredondadas.
O interior apresentava um aspecto discreto, espaço era o destaque do modelo, pois podia acomodar com conforto cinco passageiros, os bancos dianteiros era grandes, reclináveis e já contavam com apoio de cabeça. O painel exibia dois grandes mostradores circulares, à esquerda velocímetro, ao centro relógio de horas e conta-giros (na versão mais luxuosa) à direita um módulo que concentrava medidor do tanque de combustível, termômetro do líquido de arrefecimento e diversas luzes-espia. O volante de três raios conferia um aspecto de esportividade.
Técnica distinta
O conjunto mecânico da família 100 adotava a tração dianteira, foi construído em torno do motor de quatro cilindros de cinco mancais que deslocava 1.760 cm³; alimentado por um carburador Solex de taxa de compressão de 10,2 e produzia 100 cv. Para a linha 1972 adicionada uma versão de 1.872 cm³ alimentada por um carburador de corpo duplo, com taxa de compressão de 8,2, que fornecia 91 cv; esse mesmo trem de força em 1975 recebeu o sistema de injeção de combustível Bosch CIS e resultou em 95 cv. Um layout comum para Audis na década de 1980, este carro montou seu motor longitudinalmente, à frente do eixo dianteiro, com o radiador deslocado para a esquerda. Acoplado ao motor estava um câmbio manual de quatro marchas ou um automático de três marchas opcional.
A suspensão traseira adotava o eixo rígido com barra de torção e barra Panhard. Já a suspensão dianteira era independente com braços sobrepostos. Uma característica técnica interessante do modelo 100 eram os freios dianteiros a disco montados juntos ao câmbio e não nas rodas, o que colaborava para a redução do peso não suspenso. A partir dos modelos 1976 os discos de freios passaram a montados no conceito tradicional, dentro das rodas.
Uma novidade na linha 1970 era a chegada da versão 100 Coupé S, que brindava os consumidores com visual cupê fastback, com praticamente toda a carroceria exclusiva, vidros mais inclinados e saídas de ar nas largas colunas traseiras. Quando comparado ao sedã era mais curto (4,39 contra 4,59), largo (1,75 ante 1,73) e baixo (1,37 contra 1,42) e utilizava pneus mais largos, 185/70-14 em vez de 165/80-14. O cupê era movido por um novo motor, de 1.871 cm³, alimentado por dois carburadores Solex e 115 cv, que permitiam ao modelo acelerar de 0 a 100 km/h em 11 segundos e atingir a velocidade máxima de 185 km/h. Para distingui-lo visualmente, o 100 Coupé tinha quatro faróis circulares, que mais tarde seriam aplicados à carroceria sedã.
Os dirigentes da planta de Ingolstadt haviam previsto que a Audi poderia vender 300 mil Audi 100 C1, quando, de fato, 796.790 carros (de acordo com os registros da empresa) foram construídos até o final da produção em agosto de 1976. Ficou claro que o modelo havia vencido, e o modelo 100 apontou para um caminho a seguir para toda a linha Audi, trabalhando para consolidar seu lugar como divisão de luxo dentro da Volkswagen.