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Volkswagen Fusca 1500 1971, quando o superlativo de Fusca é Fuscão

Com um motor mais potente e um acabamento mais esmerado, a versão 1500 foi apelidada de Fuscão e elevou o modelo a um novo patamar de luxo e conforto

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Por Anderson Nunes


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No início da década de 1970 a comercialização do Fusca ainda estava no auge. Em 1971 o modelo alcançou recorde de produção anual de 1 milhão e 291 mil unidades e, no começo do ano seguinte, o Fusca superou o total de produção que havia sido alcançado pelo Ford Modelo T, 45 anos antes, e assim se consolidou como o modelo mais produzido na história do automóvel com mais de 21 milhões de unidades ante aos 15 milhões do modelo do oval azul. 

Apesar do clima de festa que imperava nos corredores na sede da empresa, em Wolfsburg, os dirigentes sabiam que o futuro do carro-chefe da marca estava em risco. Embora a curva de vendas do Fusca estivesse estabilizada no mercado alemão e caísse no geral no mercado europeu, a comercialização do besouro mantinha-se em alta nos Estados Unidos, superando inclusive a da Alemanha. Porém foi justamente na América que emergiu o sinal de alerta e que poderia ameaçar a trajetória de sucesso do popular Volkswagen: o aumento de exigências na legislação de segurança veicular.

Novas propostas de modelos começaram a ser estudadas para substituir o tradicional Volkswagen Sedã nos mercados desenvolvidos. Assim, em junho de 1974 era apresentado o Golf. O modelo, apesar de ter menores dimensões externas que o besouro, oferecia muito mais conforto e segurança, em parte devido à disposição mecânica, motor dianteiro na posição transversal, essa foi receita de sucesso e que logo o transformaria o modelo em best-seller de vendas da Volkswagen. Já nos países emergentes, onde a legislação veicular não era tão exigente, o Fusca ainda conseguia manter as boas vendas, isso devido suas características de robustez e confiabilidade mecânica. 

OUTRO NÍVEL

Foi em 03 de janeiro de 1959 que as primeiras unidades do Fusca produzidas no Brasil, na planta localizada às margens da Rodovia Anchieta, em São Bernardo do Campo (SP), deixaram a linha de montagem. No início, muitas das peças usadas na montagem do “besouro” no Brasil eram importadas, mas a Volkswagen conseguiu atingir um índice de nacionalização de 95% já em 1961. No mesmo ano, o modelo ganhou nova transmissão de quatro marchas, agora sincronizada. E partir de 1962, o Fusca caiu de vez nas graças dos brasileiros e passou a liderar com folga o mercado, com seu modesto motor de 1200 cm³. 

A Volkswagen sempre procurou fazer alterações em doses homeopáticas no Fusca aqui no Brasil, foi assim em 1967 quando foi adotado o motor de 1300 cm³. Entretanto na virada da década de 1970 a trajetória do Fusca no mercado nacional rompeu com tímido ciclo renovações e brindou os consumidores com um modelo dotado de um motor mais potente, mais seguro e luxuoso – era o VW Fusca 1500, apelidado pelos próprios funcionários da marca de “Fuscão”. 

Entre as novidades o destaque ficava por conta do motor boxer mais potente que já equipava a versão alemã desde 1967, ano que em também passou a equipar a Kombi e o Karmann-Ghia produzidos aqui no Brasil. O propulsor mantinha o mesmo virabrequim do 1300, o que resultava num curso de pistões de 69 mm e vinha com cilindros de 83 mm, com isso chegava-se à cilindrada de 1.493 cm³. O motor era alimentado por um único carburador de corpo simples Brosol-Solex de 30 mm, o que resultava em 44 cv líquidos a 4.000 rpm e o torque, 10 m.kgf (líquidos) a 2.000 rpm.

As relações das marchas foram mantidas, as mesmas desde que o câmbio passou a ser totalmente sincronizado em 1961, todavia o diferencial foi alongado, de 4,375:1 para 4,125:1, o que tornava mais agradável viajar em velocidade de cruzeiro. Nos primeiros testes realizados na época, o modelo 1500 atingia velocidade máxima de 127 km/h – cerca de 10 km/h superior à da versão 1300, que tinha 38 cv (potência líquida), pode parecer pouco, mas era um ganho expressivo de desempenho, sendo que Fuscão pesava 800 kg conta 780 kg do “Fusquinha”.

Atualizações nas suspensões e freios também se fizeram presentes no Fusca 1500. O eixo dianteiro era todo novo, os braços arrastados eram apoiados em articulações esféricas em vez dos antigos pinos-mestre. Os articulares superiores na extremidade dos braços eram montados em buchas excêntricas, permitindo pequenos ajuste de cambagem. O intervalo de lubrificação passou dos 2.500 para 10.000 km, e havia agora apenas 4 pontos de graxa em vez dos 10 antes. 

Outra novidade era a fixação das rodas que passou a ser com quatro parafusos, em vez de cinco. Havia também novos tambores de freio e como opcional os freios dianteiros a disco. As rodas de 26 furações com as charmosas calotas davam um aspecto mais sofisticado ao Fusca 1500. Na traseira, bitola aumentou em expressivos 62 mm, era montada uma barra compensadora em forma de “Z’ sobre o transeixo cuja finalidade era aumentar a força da roda contra o solo e, assim, diminuir a tendência de sair de traseira. 

NOVO VISUAL 

Externamente, o VW 1500 empregava a mesma carroceria dos modelos fabricados na Alemanha a partir de 1967. Entre as mudanças estavam os para-choques que passaram a ser de lâmina única, sem as tradicionais garras, além de ficarem em posição mais alta. Com isso, o capô dianteiro foi levemente redesenhado, o mesmo acontecendo com a tampa do motor que foi encurtada e recebeu, pela primeira vez no Fusca nacional, fendas para o arrefecimento do motor, cada lado com cinco aberturas. As lanternas maiores eram tricolores, incorporavam pela primeira vez a luz de ré, além de novos piscas dianteiros de maiores dimensões. 

No interior, o painel de aço passou a ser revestido por um material plástico que imitava madeira de jacarandá –faixa decorativa esta estendida às forrações laterais de portas. Os instrumentos ganharam uma nova grafia e as telas de proteção dos alto-falantes passaram a ser pintadas em preto fosco, bem como a tampa do porta-luvas. Para os passageiros do banco de trás a novidade era a possibilidade de bascular os vidros laterais, um conforto a mais em viagens longas. O volante do tipo “cálice” preto fez a estreia no modelo.

O ar de requinte era promovido pelos novos bancos, mais confortáveis, reforçados pelo revestimento de courvim de gomos altos. Outra alteração foi efetuada nos encostos dos bancos dianteiros que haviam ficado mais finos, o que aumentou o espaço para as pernas dos passageiros no banco de trás. A tapeçaria também teve a paleta de cores ampliada além do tradicional preto, havia agora o gelo, marrom ou caramelo, que podiam ser combinadas com as novas cores da carroceria que a passaram a ser disponibilizadas exclusivamente para o Fusca 1500.

Por apresentar um acabamento esmerado, além de mais veloz e seguro, surgiram rumores que a produção do Fusca 1300 poderia ser encerrada. Isso porque a diferença de preço entre os dois modelos era de apenas 4,6%: o preço do VW 1500 era de Cr$ 13.186, enquanto o modelo 1300 era cotado em Cr$ 12.571.

Entretanto, as críticas referentes ao consumo de combustível do Fuscão jogavam contra o modelo, parte da culpa devido à escolha de um único carburador que ao mesmo tempo que amarrava o desempenho do motor, obrigava a uma calibração com mistura ar-combustível muito rica devido ao longo tubo de admissão. Essa receita mecânica refletia diretamente no consumo combustível – que no modelo 1500 ficava na média de 8,5 km/l, enquanto a média do 1300, ficava na casa dos 11 km/l. 

AJUSTES ESTÉTICOS E MECÂNICOS

Para a linha 1973 a linha Fusca recebeu uma leve mudança visual, com para-lamas dianteiros redesenhados para abrigar os novos faróis que ficaram na posição vertical, como já acontecia com o Fusca europeu. A tampa do motor recebeu uma atualização, com quatro saídas e um total de 28 aberturas para a circulação de ar. Na mesma ocasião, também foram realizados alguns aperfeiçoamentos no motor do Fusca: a taxa de compressão passou para 6,8:1 (antes era 6,6:1), enquanto o distribuidor, carburador e o eixo de comando de válvulas foram modificados. A mudança importante foi feita no distribuidor, cujo o avanço passou a ser misto – centrífugo e a vácuo. 

Internamente os bancos receberam uma nova costura eletrônica e revestimento em courvim rugoso. Nas laterais das portas foram acrescentados novos apoios de braços. Uma opção pouco conhecida foi o revestimento na tonalidade vinho (exclusivo da linha 1500 fabricada em 1973), que fazia par com a pintura Branco Lotus. Um acrescimento no catálogo foi a inclusão da versão 1500 Básica (também chamada de Standard ou “Série Bravo”), que mesclava a mecânica do Fuscão com o acabamento mais simples da versão 1300, tais como as lanternas menores bicolores e o painel sem o revestimento plástico que imitava madeira de jacarandá.    

FUSCÃO JOVEM

A produção continuada do Volkswagen Fusca no Brasil foi de 1959 até 1986. Após esse período, em 1993, a pedido do então Presidente da República Itamar Franco, o carro voltou a ser fabricado. O final definitivo do Volkswagen Fusca no Brasil ocorreu em 28 de junho de 1996, quando saiu oficialmente de linha.

Ao todo, foram produzidos 3,3 milhões de unidades do Fusca no Brasil nos dois períodos. Até os anos de 1970, já circulavam pelo país 1,5 milhão de exemplares. E um desses exemplares remanescentes dessa época de ouro do besouro é o Fusca 1500 ano 1971, do bancário Raphael Campos, 25 anos, da cidade de São José dos Campos. O bancário, que é apaixonado por carros antigos e Fuscas, conta que essa admiração começou ainda na infância. “Gosto de carros antigos desde que me conheço por gente. Já na infância frequentava encontros de carros antigos com meu tio e irmão, a paixão vem de família”, diz.

O Fuscão que ilustra a nossa reportagem foi encontrado pela internet. Foi a realização de um sonho, pois trata-se de um Fuscão 1500 1971, primeiro ano de produção do modelo. “Sempre tive vontade de ter um Fuscão, quando chegou a hora fiz uma pesquisa cuidadosa pelo carro na internet e cheguei neste modelo. Acabei por adquiri-lo por dois fatores: o estado geral do carro, muito original e por ser o primeiro ano de produção deste modelo”, frisa Campos.

A minuciosa pesquisa vale a pena, pois não foi necessário investir dinheiro para restaurá-lo. O Fuscão encontra-se com um bom nível de originalidade, atestado este que pode ser comprovado pelos selos dos vidros de fábrica, lanternas em acrílico da Polimatic e por fim o acabamento interno. O proprietário precisou somente fazer um polimento na pintura. 

Dono de um Ford Corcel II Luxo 1978 e de um Chevrolet Monza 1996, Raphael disse que o Fusca está à venda. “Já curti o suficiente o Fusca e agora chegou a hora de encontrar uma nova garagem para ele. Meus planos é vendê-lo e investir em outro carro antigo”, diz sorrindo. 

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