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Chevrolet Suburban Carryall, ícone americano e o modelo mais antigo em produção no planeta

Produzida há 85 anos, a Suburban estabeleceu o segmento utilitários e continua sendo referência no transporte de pessoas e cargas

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Por Anderson Nunes


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Em 1935, a população dos Estados Unidos era de pouco mais de 127 milhões de habitantes. Um selo de primeira classe custava 3 centavos de dólar, a tecnologia Technicolor (filme colorido) foi apresentado ao cinema no longa metragem intitulado Beleza e Vaidade, e o último concreto fora derramado na barragem Hoover, a maior do mundo a época. Nesse mesmo ano, a Chevrolet lançava o Suburban, o ancestral dos atuais utilitários esportivos.

Ainda em produção nessas mais de oito décadas desde sua estreia, o Suburban ganhou o título de placa de identificação mais antiga do setor. De fato, o grande utilitário da Chevrolet é o primeiro veículo a atingir 85 anos de produção contínua. Ao longo dos anos, o modelo consolidou seu lugar de destaque no setor automotivo, seja fazendo parte de uma grande família, guarda-costas de confiança e membro das forças armadas, socorrista e até estrela de cinema, o grande utilitário construiu um legado impressionante e incomparável em seu segmento. Nem mesmo durante a Segunda Guerra Mundial sua produção foi interrompida, pois foi utilizado para muitas funções pelos norte-americanos e aliados.

As bases do que conhecemos hoje como a Suburban na verdade, nos remontam para o final da década de 1910 e com o próprio nascimento da marca Chevrolet. Fundada em Detroit em 3 de novembro de 1911, a Chevrolet até 1917 produzia apenas carros. A empresa passou a oferecer seus primeiros chassis comerciais em janeiro de 1918. 

AO GOSTO DO CLIENTE

Dois modelos dotados de motores de quatro cilindros marcaram a entrada da Chevrolet no mercado de utilitários em janeiro de 1918. Ambos eram unidades na configuração “chassis com cabine” e que saíam da fábrica apenas com o capô frontal em aço estampado. Na época, era costume o comprador obter apenas o chassi e adequar o modelo com uma caçamba ou compartimento todo fechado para atender a seus propósitos.

Com preço de 595 dólares, o chassi de meia tonelada do Light Delivery era essencialmente um veículo de passeio modelo Chevrolet 490 sem a carroceria, equipado com molas traseiras mais robustas. Era um utilitário de entrega leve, ágil e econômico focado principalmente para os lojistas e entregas urbanas. 

Com capacidade de 1 tonelada o Chevrolet “Modelo T” de 1918 (já considerado na época um “Caminhão”) custava 1.125 dólares sem a carroceria e foi construído sobre uma estrutura mais forte, além de ser mais longo que o modelo de meia tonelada. Sob o capô havia um motor de 37 cavalos de potência que possibilitava ao caminhão transportar cargas mais pesadas a uma velocidade máxima limitada pelo governo de 40 km/h.

Nos anos 20, as picapes e caminhões ganharam notoriedade, com o crescimento do comércio, da construção civil e das estradas. As vendas da Chevrolet nesse segmento subiram durante a década batendo recordes anuais até 1929, quando 187.103 veículos foram vendidos.

Em 1929, a Chevrolet lançou o motor de seis cilindros em linha, de 3,4 litros e 60 cv que se tornou a lendária “Maravilha do Ferro Fundido”, conhecido também como Stovebolt. Desde esse ponto até meados de 1955, todos os utilitários leves da Chevrolet seriam movidos a motores de seis cilindros. 

DE INÍCIO A MADEIRA

Até meados dos anos de 1930 o meio de transporte mais comum entre os norte-americanos que pretendiam cortar o país de Leste a Oeste eram os trens. Ao chegar em cada estação os passageiros tinham como opção um serviço de translado para levá-los aos centros das cidades ou aos hotéis. Tal tarefa de deslocamento era feita por veículos de passeio transformados em pequenas lotações, estas dotadas de carroceria de madeira e geralmente com proteções laterais das janelas feitos de lona. No interior havia um arranjo de três fileiras de bancos e as bagagens iam acondicionadas em um rack de teto. Com o tempo, esse serviço ficou conhecido como “Station Wagon”, ou simplesmente vagões de estações. 

Entretanto, apesar de versáteis, o chassi do carro e a estrutura de madeira eram sujeitas a danos e a fadigas, o que comprometida a durabilidade e segurança dos ocupantes. Ciente da baixa durabilidade desses componentes, a Chevrolet começou a testar protótipos com carrocerias de aço estampado e montada em um chassi comercial de meia tonelada mais resistente.

O projeto previa que o modelo pudesse transportar até oito pessoas, além de um amplo compartimento de bagagens. Sua carroceria de aço o tornaria mais durável, além de mais fácil de manter do que os veículos com carroceria de madeira oferecidas na época.

UM NOME, VÁRIOS MODELOS

Em 1933 os Estados América estavam emergindo dos rigores causados pelo Crash da Bolsa de Valores de Wall Street e da Grande Depressão. Muitos norte-americanos mudaram de cidade e foram em busca de uma vida melhor em outras localidades do país. As estradas, muitas ainda sem pavimentação e empoeiradas, não eram um atrativo para longas viagens, a ferrovia ainda era o melhor meio de transporte para longas distâncias.

Os passageiros que chegavam com suas malas queriam continuar sua jornada com conforto, talvez para um dos muitos subúrbios que começavam a florescer nas cidades da América. 

Foi nesse contexto que emergiu um tipo de carro, uma espécie de perua dotada de muitas janelas e com um amplo compartimento para bagagens no interior do veículo, nascidos a partir de um furgão de cargas. Esses novos carros ganharam o apelido de “Suburban”, subúrbio em inglês. Várias empresas automotivas nos Estados Unidos usaram a designação “Suburban” para indicar seus respectivos modelos com tal carroceria, incluindo Dodge, Studebaker, Nash, e a própria Chevrolet. 

Vale ressaltar que o nome Suburban era, de fato, uma marca comercial da companhia US Body and Forging Co. de Tell City, Indiana, que construía carrocerias de madeira para todos esses chassis de automóveis e caminhões leves. Porém, a empresa nunca pediu o registro de patente do nome.

A Chevrolet já oferecia em seu catálogo desde 1933 uma perua construída sobre uma carroceria de madeira de oito lugares que tinha como base um chassi de um caminhão leve de meia tonelada. Esses veículos em um primeiro momento foram fabricados para o Corpo de Conservação Civil e a Guarda Nacional. Embora fossem versáteis e tivessem uma grande capacidade para transportar pessoas e volumes cargas, tinham como desvantagem a carroceria de madeira, considerada frágil para os propósitos pretendidos.

NERVOS DE AÇO

Foi em 1935 que a Chevrolet estreou o seu modelo multiuso, um misto entre um caminhão leve de meia tonelada, um carro de passageiros: eles o batizaram de Chevrolet Suburban Carryall. Este veículo de até oito lugares era baseado no mesmo chassi e mecânica de seu antecessor de 1933, mas a carroceria toda feita de aço e suspensões reforçadas faziam dele o modelo mais resistente produzido nos Estados Unidos durante a década de 1930.

O chamariz era o amplo espaço que trazia como novidade o arranjo de assentos que acabaram por se tornar padrão nesse tipo de veículo: três passageiros no banco dianteiro, dois no banco traseiro central e três no banco traseiro. Na traseira a tampa do porta-malas podia receber duas portas com abertura lateral com dobradiças ou, opcionalmente, uma porta traseira dobrável com janela escamoteável.

Versáteis, os bancos removíveis proporcionavam uma grande área de carga de 3.259 litros quando os assentos da segunda fila eram dobrados e os da terceira removidos. O painel de instrumentos continha o velocímetro central acompanhado de medidores de combustível, temperatura da água, pressão do óleo e amperímetro.

Este primeiro Chevrolet Suburban Carryall era impulsionado por um trem de força Chevrolet “Stovebolt” de seis cilindros em linha, com comando de válvulas no bloco de 3,2 litros (194 pol³) que produzia 60 cv. Esse motor apareceu pela primeira vez em 1929 e ganhou o apelido de “Stovebolt” porque os parafusos usados nele pareciam aqueles que prendiam os fogões a lenha. A taxa de compressão era de 5,2: 1. A transmissão era uma caixa manual de três velocidades.

O preço base do Suburban original para oito passageiros era de cerca de US $ 675. A lista de opcionais era composta por um rádio, aquecedor, relógio e até mesmo o para-choque traseiro era uma opção extra. Apesar do valor alto, a Suburban colaborou para um aumento de 21% nas vendas de caminhões Chevrolet em relação ao ano de 1934.  

A linha Suburban mudou pouco para o ano de 1936, as atualizações no segundo ano incluíram a adição de freios hidráulicos, que aumentaram a segurança nas frenagens. Na parte mecânica houve uma modernização no motor Stovebolt que passou para 3,4 litros (206 pol³)e tinha como novidade a taxa de compressão mais alta e um novo carburador de melhor rendimento.  

Uma atualização visual é aplicada à linha 1937, inspirada no movimento da Art Déco, o grande utilitário ganhou linhas mais arredondadas, traços esses presentes na dianteira, laterais de janelas e um leve caimento de traseira. A tampa do porta-malas passa ser dividida ao meio, sendo a parte inferior uma grande plataforma para colocação ou retirada de bagagens, ou até mesmo uma ampla mesa de piquenique. O motor de seis cilindros passou a deslocar 3,5 litros (216 pol³) com potência de 79 cv.  

Até 1940 o modelo manteve a forma básica apresentada três anos antes, mas a dianteira recebia um visual mais caprichado e encorpado. O destaque era a ampla grade cromada de frisos verticais. No capô aparecia outra, menor e de frisos horizontais. Os faróis vinham redesenhados, agora em formato de gota. A vigia do traseiro era bipartida com dois pequenos vidros em formato oval. Internamente o quadro de instrumentos recebia um formato retangular, sendo o velocímetro alocado ao centro ladeado por quatro pequenos relógios. 

Como aconteceu com todos os fabricantes de veículos dos EUA, a GM interrompeu a produção de carros entre 1942 a 1945 por conta da Segunda Guerra Mundial,  na qual o grande utilitário foi recrutado para ser veículo de apoio, carro oficial dos generais e ambulância. A fabricação foi retomada, em 1946, foi quando os consumidores se depararam com o Suburban congelado no tempo: era o mesmo modelo disponível no início da década de 1940, algo que não fugia à regra das demais fabricantes.

Foi somente em 1947 que estreava uma Chevrolet Suburban de nova geração. Isso ficará para uma próxima história aqui na seção Do Fundo do Baú.  

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